Pastor 'Caveira' solta o verbo: “Evangelismo não é uma 'gincana de almas'”

Texto: Jénerson Alves
Fotos: Larissa Albuquerque


O pastor Daniel Oliveira, ou melhor, Daniel 'Caveira' é líder da ARCA (Ação de Rua e Cultura Alternativa), uma iniciativa missionária interdenominacional que atua há 16 anos nas ruas do Recife. Com uma vasta experiência em Evangelismo Pessoal de grupos alternativos – a exemplo de skatistas, homoafetivos e garotas de programa –, 'Caveira' faz questão de dizer que a simplicidade do Evangelho é a melhor estratégia para testemunhar a fé. Ele declara que o amor ao próximo é a marca do cristão, e que o evangelismo deve ser entendido como um estilo de vida. Preletor oficial do 40º Congresso da Juventude Batista, 'Caveira' também ministrou uma oficina sobre Evangelismo Pessoal e foi um dos 'cabeças' da mobilização contra a corrupção que ocorreu na manhã do sábado 26, impactando a cidade de Caruaru. Nesta entrevista a Presentia, ele faz um balanço do Congresso e analisa o cenário atual da igreja evangélica no Brasil. Confira:



O senhor foi preletor oficial do 40º Congresso da Juventude Batista do Agreste, que ocorreu em Caruaru entre os dias 24 e 27 de março. O tema do evento foi 'Jesus é suficiente', em alusão à Confissão de Westminster. Em termos práticos, o que significa afirmar a suficiência de Jesus?
Durante os nossos momentos com a juventude aqui, tentamos pautar nossas conversas com argumentos bíblicos. Quando falamos sobre a suficiência de Jesus, encontro no apóstolo Paulo um exemplo, inclusive no aspecto prático. Na Carta aos Filipenses, ele afirma que, para ele, “viver é Cristo e morrer é lucro”. Essas palavras foram escritas quando ele estava preso, prestes a ser condenado – talvez até à morte. Mesmo assim, ele se alegrava com o crescimento do Evangelho e dizia que, se ele morresse, não haveria problema, pois o seu destino seria a Glória, e, se ficasse, seria bom porque ele continuaria servindo a Deus. Em uma situação assim, talvez alguns de nós, hoje, estaríamos desesperados. Porém, o conceito de Paulo sobre vitória era outro. Esse é o desafio que tentamos trazer para a juventude. É o jovem entender que é necessário conhecer o seu Criador e encontrar nEle tudo. Tudo o que o ser humano precisa vai encontrar no Criador, na revelação da Palavra. Isso foi trabalhado inclusive através do texto de Eclesiastes 12:1, quando Salomão afirma que é necessário o jovem ter alegria no Criador. Além disso, falamos sobre a importância da experiência pessoal com Deus, bem como nossos conceitos de Igreja, Evangelho, Confissão de Pecado, Discipulado e Amor ao Próximo. Chegamos à conclusão que somente nos aproximando do Criador teremos os conceitos certos de tudo isso.


O senhor também ministrou uma oficina sobre Evangelismo Pessoal. O que foi abordado?
Então, foi legal, porque nós vínhamos nessa 'pegada' de repensar tudo. Eles absorveram bem o conceito de Evangelismo. Muitos pensam que evangelizar é sair pelas ruas com um bolo de panfletos nas mãos e distribui-los para a galera, dizendo 'Jesus te ama'. Nós entendemos que isso também pode ser evangelismo, mas evangelismo não é apenas isso. Evangelizar é um estilo de vida, fazer outras pessoas conhecerem Jesus por meio de nós, muitas vezes sem ser necessário abrir a boca.


Como ação prática dessa oficina, foi realizada uma ação na Feira de Artesanato. De que forma o desafio foi encarado?
Ação impactou a cidade de Caruaru no sábado, dia 26
Muitos congressistas não eram moradores de Caruaru. Foi um desafio mostrar algo sobre Jesus para a cidade. Então, chegamos à conclusão que atualmente no Brasil um grande tema tem sido a corrupção. Assim, decidimos, enquanto igreja, fazer um ato contra a corrupção. Fizemos cartazes, mas também fizemos um questionário e perguntamos às pessoas o que elas pensam sobre corrupção. Perguntamos a religião das pessoas e o que elas pensavam sobre o papel da igreja delas acerca da corrupção. Além disso, oramos pelo Brasil e pelas pessoas que estavam conosco. Durante esta manhã, pudemos sentir e transmitir o que é se importar com algo que não seja sua vida nem sua comunidade de fé, mas chegar em uma praça e pensar como contribuir para a coletividade. Isso é evangelizar, é iniciar um discipulado, é mostrar que Jesus não aprova a corrupção.


Então, o evangelismo precisa de contextualização? Encontrar um ponto de diálogo com o contexto imediato, no sentido de posteriormente apontar para a mensagem de Cristo?
O problema é o seguinte: enquanto igreja, fomos muito condicionados a entender o Evangelismo como uma gincana de almas. Como se Jesus estivesse com um pote, esperando que depositemos vidas lá dentro. Evangelismo não é isso. Nós precisamos representar o Criador do Universo, que tem a chave para tudo, o melhor estilo de vida para o ser humano. Partindo desse princípio, a igreja simplesmente deve transmitir essa mensagem, esse amor de Jesus, para as pessoas.
Ir às ruas e se preocupar com a corrupção é cumprir um mandamento bíblico. Jesus manda que amemos o próximo como a nós mesmos. Quem ama não corrompe nem desvia verba. Qualquer coisa que vá contra o amor – a Deus sobre todas as coisas e ao próximo – é uma forma de afronta ao Criador. Então, o evangelismo envolve todas as dimensões da nossa vida. Quem receber isso recebe a eternidade.


Você é um pastor bem jovem. No entanto, você acha que às vezes a liderança pastoral não consegue dialogar com a juventude?
Você falou um ponto que é um grande motivo de preocupação. Eu aproveito e mando um recado para todos os colegas pastores: a Igreja de Jesus Cristo é feita de gente. Não há classe social, cor predominante nem idade (ou não deveria ter). Como pastores, temos a obrigação de dialogar com todos. Esse é um dos desafios do pastor hoje. O reino de Deus é necessário para a criança. A Igreja precisa suprir essa criança, atendê-la, protegê-la. Ela tem de estar em um ambiente livre de agressões, de violência, de abuso sexual, e também de diagnóstico, caso ela esteja sofrendo uma dessas questões. A igreja precisa intervir e parar com isso. É preciso pensar ainda: qual o papel da igreja diante de um adolescente, vivenciando tantas crises psicológicas? Qual o papel da igreja diante do jovem, com tantos conceitos, com uma sociedade tão relativizada? Movimentos sociais, minorias, adultos, casados, solteiros, viúvos(as). Tudo tem de ser alvo de reflexão. A igreja é uma amostra da sociedade. Como pastores temos de ter essa consciência. A Palavra deve ser um instrumento de diálogo para a igreja e a sociedade. Muitas vezes, pecamos com o diálogo com a juventude. O jovem hoje é antenado, tem acesso a informações e está querendo usar isso a favor do reino de Deus. Devemos ajudá-lo a ser um instrumento dentro do reino de Deus através da igreja. No entanto, vejo muito a juventude querendo fazer e, às vezes, não tendo espaço para realizar, sem voz na igreja. Há muitos jovens tristes, decepcionados, sem templo. Os pastores devem ser reciclados, para entender o papel do jovem diante da nossa realidade.


O que parece, porém, é que mesmo diante de cenários contemporâneos, é necessário voltar os olhos para a 'velha' e eterna mensagem do Evangelho…
É isso mesmo. Em um dos sermões, chegou a ser hilário, pois apresentamos vários desafios do nosso tempo, mas encontramos todas as respostas em um versículo da Bíblia. O problema é que a igreja tem deixado de lado o básico, que é a leitura da Bíblia e a oração. Do ponto de vista exegético, a igreja tem sido analfabeta. Por isso, não poderia ficar diferente do que está hoje.


A perspectiva bíblica foi enfocada durante as preleções
Nem sempre esse tipo de reflexão acontece na igreja. O senhor acha que eventos feito esse Congresso cumprem o papel de despertar os cristãos no sentido de repensar crenças e práticas?
Com certeza. Com certeza! Os jovens conversaram muito conosco, falaram suas insatisfações, eles estão borbulhando. A demanda é muito grande. As pessoas estão pensando e querendo mudar. Porém, muitas vezes, eles precisam de ajuda para entender o 'como'. Esse Congresso foi incrível, pois além de pensarmos juntos, pudemos fazer algo juntos, a partir do zero. Pensamos em ações práticas sobre como representar o reino de Deus hoje. Cada um fez sua parte, de modo que tudo ficou muito bom. Eu acredito que os jovens saíram daqui com teoria, reflexão e muita prática na bagagem. O evento foi fundamental nisso tudo. Que venham outros.







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