O Problema da lingua Nervosa

Este texto aborda o velho problema das línguas chamadas línguas estranhas. O fato é que desde que me conheço por gente encontro pessoas declamando verdadeiras frases esquisitas afirmando ser um momento de unção espiritual. Esta semana, de dentro do meu quarto ouvia uma pregação ocorrida em via pública cujo ministrante externando veemência e vigor tentava construir frases evangelísticas, mas que no meio delas, aparentando ser interrompido por uma “força divina”, inseria frases tipo “shek-la-ba-cânta-lá-su-ru-ma-naia” (aproveitando este parêntese, alguém já conseguiu decifrar o significado do “cânta-lá”, visto que parece ser um dialeto comum nos ritos (neo)pentecostais?) Ops!! – Aqui já reconheço que a Teologia não desenvolveu um departamento de linguística espiritual para desvendar e/ou interpretar certas expressões.

O que acontece sem sombra de dúvidas é que quando uma pessoa expressa tal dom (ou habilidade, para os que não crêem na contemporaneidade dos dons) na maioria das vezes ela perde a racionalidade do culto (Rm 12:1) e praticamente rasga os ensinamentos bíblicos. Ou seja: – a Bíblia que se vire! O que vale é que apareça o meu “espetacular dom de línguas”!

Para muitos, o falar em línguas representa um toque especial de espiritualidade, mas para o apóstolo Paulo, não. Ao escrever para a igreja de Coríntios – uma igreja de carisma e sem caráter – advertiu que ainda que ele falasse a língua dos anjos, de nada valeria, além de afirmar que preferia falar cinco palavras compreensíveis para instruir os outros a falar dez mil palavras desconhecidas.(1 Co 14:19); afinal muitos dos cristãos de corinto comumente exibiam seus domínios de línguas pátrias a frente da igreja, lendo e orando em outras línguas, porém sem que a Eclésia compreendesse.

Em nenhum momento das escrituras vejo Jesus dando um sermão recheado de expressões estranhas; em nenhum momento vejo João, Pedro ou Paulo dando demonstrações de espiritualidade através de frases sem nexo algum. Quando me interrogam sobre o falar em línguas estranhas, sempre respondo, sei um pouquíssimo de inglês porque fiz um curso intensivo, contudo reconheço que Deus não me presenteou falar em mandarim através de uma iluminação instantânea. Não tenho este dom. Reconheço.

Mas estou cansado dessa hierarquização espiritual. Quem não fala em línguas não é cheio do Espírito? Aonde tem isso na Bíblia? Chega de tanta invenção! O maior exemplo desse exibicionismo sem sentido ocorreu dentro na igreja de Corintos, então me respondam por que ainda se comete este mesmo erro hoje?
Línguas Estranhas não é vídeo game ou karaokê pra ninguém sair por aí “cantalabailando” o Evangelho de Deus.

Veja que Paulo:

1) disse que quem fala em língua desconhecida não fala aos homens, senão a Deus (1 Co 14:2-4). – Portanto desligue a língua nervosa quando não estiver edificando ninguém, caso contrário estará confundindo o culto;

2) aconselha que bem melhor que falar o idioma estranho é pregar a palavra, pois o dom de profecias é bem maior do que o de línguas (1 Co 14:5). – Isto quebra a noção hierárquica de que se tem que falar línguas para crescer espiritualmente.

3) adverte que se use a língua para pronunciar palavras inteligíveis, visto que como se entenderá o que se diz? (1 Coríntios 14:9) – Falar palavras estranhas seria como falar ao ar.

4) adverte que todo dom precisa ser para edificação da igreja (1 Co 14:12). – Que se acabe o exibicionismo!

5) ratificou que o ato de orar, adorar ou cantar precisa ser feito com entendimento para que o próximo possa concordar (1 Co 14:14-15). – Como dirão amém se as línguas estranhas tomarem conta do recinto?

6) prefere falar cinco palavras inteligíveis, portanto, por que fazer um show de “unção” lingüística que ninguém compreende? (1Co 14:18-19) – Não sejam egoísta, falem de Jesus de forma clara e objetiva!

7) não usava a língua nervosa inconseqüente, além de afirmar que aplicada de forma incorreta provocará escândalo. (1 Co 14:23) – Portanto é bom fazer o uso correto do microfone, principalmente em cultos de rua. Chega de tanto “shek-la-ba-cânta-lá-su-ru-ma-naia” pra endoidar os descrente!!

Ele enfatizou outra coisa importantíssima: se for falar em língua desconhecida, deve-se falar no máximo duas ou três pessoas, e por favor… sem intérprete não dá né? (1Co 14:27-28) – Ôh thurma das línguas, controle a língua nervosa, e caso não encontre um poliglota para interpretar, não desobedeça a palavra: Cale-se!

9 ) ainda ratificou que os espíritos dos profetas estão sujeitos a estes, e não vice-versa (1Co 14:32) – Não me venham com a desculpa de que entrou em transe e falou em várias línguas sem perceber.

10) não proibiu o uso das línguas desconhecidas, assim como não é isto que estou dizendo no texto. (1 Co 14.39-40) – Mas se realmente você tem esse dom, use dentro das ressalvas bíblicas e observe se tal língua é útil para edificação da igreja.
 
Antognoni Misael é editor do Arte de Chocar e colunista no Púlpito Cristão

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