Pedras que falam

Todo verão eu faço uma viagem sozinha. Meu maior medo é de me perder, por isso geralmente escolho uma ilha. Conseqüentemente eu sei que vou parar na beira da praia para tomar um ponto de referencia. Para amparar minha coragem sempre tenho um mapa à prova d’água e duas bússolasuma presa na minha jaqueta e a outra na minha mochila.
Uma bússola não ajuda muito se você esquecer o caminho, e muitos desses caminhos são feitos de pedra com uma camada fina de capim e flores. Quando se caminha entre pedras, você tem apenas a intuição para encontrar o caminho. Mas a intuição vai te levar somente até aqui.
Quando minha intuição falha, eu procuro por pistas; pequenas pilhas de pedras que outras pessoas deixaram em lugares cruciais para mostrar o caminho. Essas pistas podem ser facilmente proveitosas; pequenas pedras amontoadas. Algumas são artísticas, maravilhosamente arranjadas. Normalmente, as pistas são deixadas pelos primeiros mochileiros que passam pelo caminho durante uma temporada. Eles erraram o caminho, erraram de novo, até acharem a direção certa. Depois, eles retrocederam e construíram a pilha de pedras para mostrar o caminho aos futuros peregrinos.
É fácil perder uma pista. Para enxergá-las eu tenho que prestar muita atenção. Achar pistas tem me poupado rodeios desnecessários e desistências. Se você tiver carregando quinze, vinte quilos, vai ficar feliz por qualquer passo economizado. Você vai ter mais energia e menos frustrações para prosseguir a jornada. 
Descobri que a vida espiritual é cheia de pistas. Indicações que me mostram o caminho a seguir. As pistas espirituais são como as pistas de pedra. Cada uma é singular. A maioria delas aparece quando estou perdida. Todas me levam para adiante.
Algumas vezes, a pista pode ser uma pessoa que oferece uma palavra inesperada de encorajamento. Certa vez, uma pista veio de uma mulher mais experiente do que eu, cujo trabalho e vida admiro. Lamentei pelo fato de estar totalmente fora do culto. Não gostei das músicas, da pregação. Eu estava insatisfeita até com o arranjo de flores no altar.
“Oh, querida”, ela disse com sua doce voz, “você não está sozinha, escritores têm momentos terríveis no meio de pessoas”. Palavras simples, mas iluminadoras. Talvez não fosse minha igreja que estivesse mal, talvez fosse minha vida espiritual que estivesse ruim. Talvez eu estivesse tão presa que a igreja estava se tornando problemática para mim.
Ela não estava me contando aquilo porque a igreja era desagradável, eu era livre para ir embora. Ela estava me contando... bem, isso iria se tornar desagradável. Eu a respeitei - ela é uma escritora maravilhosa, e uma irmã muito ativa na nossa igreja, e quando ela disse que eu deveria viver em comunidade, ouvi. Paradoxalmente, agora a igreja é simples porque sei que não sou a única que acho isso complicado. Essa pista, suas palavras, me ajudou a encontrar uma direção.
Algumas pistas podem vir das escrituras, especialmente dos Salmos. Os Salmos me fazem lembrar que está tudo bem em se irritar, chorar, questionar, sabendo que Deus possui as respostas mesmo que eu não tenha. Ao invés de me manter imobilizada, eu posso continuar prosseguindo.
Músicas também podem ser pistas. Um exemplo para mim é um antigo hino, “Seja minha visão, Ó Senhor do meu coração, Seja tudo, mas não para me salvar por tua arte, Seja meu melhor pensamento no dia e na noite, Assim como caminhando e dormindo em Tua presença, minha luz”. Uma pista pode ser algo que já cantei, ou vi, ou ouvi antes, mas que toma um novo sentido por causa de uma situação específica ou de uma época em especial. Eu não precisava dessa pista antes. Mas ela estava lá quando eu precisei. Isso me ajudou a dar mais um passo à frente.
Às vezes, uma pista pode ser um livro que nos revela algo na hora certa. Pilgrim at Tinker Creek, de Annie Dillard, me ajudou a lidar com o sofrimento, quando eu sentia que Deus e o sofrimento eram incompatíveis. Quando senti que a minha vida era uma repetição de tarefas mundanas, Praticando a presença de Deus, do Irmão Lourenço,me fez lembrarque lavar a louça e preparar o almoço são atos de adoração. Divine Hours, de Phyllis Tickle, me convidou a estabelecer um momento para oração.  
Os poetas e seus poemas podem dar pistas também. Os poemas de Mary Oliver me recordam que eu preciso prestar atenção. A poesia de Wendell Berry me leva a viver em comunidade. Os poemas de Jane Kennyon refletem suas lutas contra a depressão, mas ele continuou escrevendo e amando  Deus. Até John Updike, cujos poemas me lembram que há beleza na escassez. Cada um desses livros, músicas, poemas, pessoas, e a escritura... cada uma dessas pistas estavam no lugar certo, na hora certa, e me ajudaram a prosseguir na minha jornada espiritual.
Não há nada muito atraente em pedras que são pistas. A maioria delas são feitas de tons cinza e preto. Se encontrasse uma pelo caminho eu não daria a mínima. Tão desgastada. Tão antiga. Por isso é que essas pedras são juntadas, por isso que alguém gasta tempo para arrumá-las em beneficio de outros, isso as torna valiosas.
Quando você usa pistas para se guiar em um  caminho, surge uma expectativa. Se você encontrar um montinho de pedras desarrumado, você vai parar e reorganizar da melhor forma que puder. Isso assegura um trajeto melhor para aqueles que seguem você, mesmo que isso atrase sua jornada.
Cada dia traz seu desafio. Eu decido ceder um espaço para prestar atenção e achar as pistas que me apontam o caminho. Eu sei que vou me perder às vezes. Mas, a cada passo que dou, me conforta saber que alguém esteve ali antes e marcou o caminho para casa.

Cindy Crosby
Copyright © 2011 por Christianity Today International
Traduzido por Yuri Nikolai

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