Reflexões sobre o Cristianismo Puro e Simples, de C. S. Lewis

O cristianismo está ao alcance de todos, mas nós vivemos numa cultura que não apenas não é cristã, como investe pesado na construção de barreiras para nos impedir de compreender a fé cristã pelo que ela realmente é: um caminho verdadeiro para a vida. Todos nós temos uma vida espiritual, uma vida que não é meramente biológica. Esta cultura nos faz pensar que para ser a favor de uma devemos ser contra a outra. Nenhum sistema de crenças é tão rejeitado pelo mundo moderno quanto o cristianismo puro e simples, e uma das melhores formas de rejeitar a fé é associá-la com o que há de pior no homem.
Antes de tudo, devemos entender duas coisas sobre C. S. Lewis e seu objetivo com esse livro:
1. Lewis não está pregando para atrair membros para sua igreja, ele está falando de como é a vida sob a perspectiva da fé cristã, em contraste com a vida fora da fé cristã.
2. O sentido do termo “cristão” deve ser descritivo e não um simples elogio. No sentido profundo, não podemos julgar quem é realmente cristão e quem não é. Você pode ser um não-cristão cheio de qualidades, ou um cristão com poucas qualidades. O que importa é estar disposto a compreender o sentido da fé cristã para sua vida e a viver de modo consistente com suas crenças.
Livro I: O Certo e o Errado como chaves da compreensão do mundo.
Todos nós separamos o certo do errado. Alguém que diz que não existe certo e errado não consegue viver de acordo com isso. Sem certo e errado, nada do que fazemos tem qualquer sentido. A natureza humana é regida por leis naturais específicas do homem, que são chamadas de leis morais. A diferença entre as leis morais e as outras leis naturais é que elas só podem ser obedecidas voluntariamente. Uma pedra não tem escolha quando a soltamos no ar. Mas uma pessoa tem escolha entre fazer ou não fazer aquilo que a sua própria moralidade recomenda. Por isso o homem é capaz de experimentar a dúvida moral.
No livro Abolição do homem, Lewis debate sobres os valores tradicionais, universais e objetivos, que ele chama de Tao. Ele deixa claro que a religião judaico-cristã foi apenas uma das culturas que defendeu o Tao, dando sua própria interpretação para ele. As diferenças culturais, quando se trata das leis naturais, são superficiais. Em todas as culturas a moralidade humana parece ser regida por algumas leis comuns. Imagine como seria uma cultura que não se aproximasse nem um pouco do Tao. Provavelmente ela seria inviável. Se não existisse lei natural para limitar o comportamento humano, não poderíamos diferenciar o que é justo do que é injusto. Mesmo quando eu rejeito uma lei, eu a rejeito em vista de outra lei. Nunca consigo rejeitar tudo que faz parte do sistema moral.
Ninguém segue a lei natural à risca. Os erros fazem parte do aprendizado, mas só podem ser compreendidos enquanto erros quando há uma noção do que não é um erro. Eliminar a noção de erro seria querer eliminar o sentido da ação humana. Mas o sentido da ação não é definido por uma lista de coisas permitidas e uma lista de coisas proibidas. Todas as ações são geradas por impulsos, e não há impulsos humanos que são bons por si sós ou maus por si sós. A lei natural indica quando seguir um impulso e quando não segui-lo. Se a lei natural não levasse em conta o contexto, não exigiria ponderação. Da mesma forma, na música não existem notas que são em si mesmas boas ou más, mas sim notas que formam uma melodia e notas que são dissonantes em relação a essa mesma melodia.
A lei natural não é instintiva nem é equivalente ao instinto. Os instintos são cegos, competem entre si e precisam de uma força ordenadora. Ao mesmo tempo em que o instinto de preservação da espécie nos diz para salvar a vida de alguém, o instinto de auto-preservação nos diz para deixar outra pessoa fazer isso. Não escolhemos com base no instinto mais forte, ou não estaríamos realmente escolhendo. Sem a capacidade de seguir ou não seguir os preceitos morais, nós perderíamos nossa liberdade. Se fôssemos meramente seres movidos por impulsos ou pulsões nossa vida perderia o sentido: seria caminhar num espaço infinitamente vazio.
Os instintos podem ser despertados ou adormecidos, atiçados ou amortecidos. Se isso é verdade, então aquilo que dá vazão ou repreende um instinto não pode ser o próprio instinto, mas uma qualidade moral. O impulso não determina necessariamente o nosso comportamento, mas nós criamos dispositivos para facilitar ou dificultar a manifestação dos impulsos. Ser equilibrado é ter o poder de dizer não a um impulso forte, e sim a um impulso fraco. Por isso o senso moral não é a repressão dos impulsos malignos, mas a liberdade de escolher sem se sujeitar aos impulsos.
“A coisa mais perigosa que podemos fazer é tomar um impulso de nossa natureza como critério a ser seguido custe o que custar”, diz Lewis. E muitos vilões de histórias em quadrinhos são exatamente aqueles que querem fazer o “bem” a qualquer custo.
Será que nós tivemos algum avanço moral desde o tempo em que queimávamos bruxas na fogueira? Nós só deixamos de fazer isso porque não era mais conveniente. Nós não deixamos de queimar bruxas por um avanço moral ou maior respeito à vida humana, mas porque não acreditamos mais em bruxas. Não deixamos de escravizar porque passamos a respeitar os seres humanos, mas porque outros modos de exploração são mais efetivos.
Ser maligno é diferente de ser inconveniente, assim como ser bom é diferente de ser conveniente. Certo e errado transcendem os fatos, se trata de algo que ocorre no coração.
Hoje em dia as pessoas acreditam num deus domesticado, que não nos ensina como viver e não interfere com nossa vida. É o equivalente ao acaso ou à totalidade das forças. Essa crença o liberou do fardo de viver para além do presente. Mas viver pelo presente acelerou o processo de degradação. Quando se avança sem saber para onde se está indo, não adianta acelerar para tentar chegar mais rápido.
Deus é a pessoa que mais tememos encontrar, porque é o único que nos conhece totalmente. É muito difícil admitir que nós estamos atolados na maldade e não sabemos o que fazer para mudar isso. É preciso buscar a verdade, e não o consolo. Se a doença é curada, acaba a dor, mas acabar com a dor não cura necessariamente a doença. Nós reclamamos de Deus quando ele não acaba com a dor, mas não queremos que Ele cure as doenças que nos causam prazer.
Livro II: No que acreditam os cristãos
Pessoas dentro e fora do cristianismo têm dificuldade de distinguir entre o que é preciso e o que não é preciso para ser cristão. Desde seu princípio, o cristianismo pregou a metanóia, a mudança das disposições mentais. A ênfase de Cristo foi restaurar crenças vitais sobre o sentido da vida.
Se analisarmos uma crença comum hoje em dia, que aceita Deus como uma força que anima o universo, porém não interfere no curso da história (e até Richard Dawkins diz ser simpático a essa noção), e pensarmos como chegamos a acreditar nisso, podemos chegar a uma filosofia influente, que defende a ideia de que “Deus é Natureza”.
Se levarmos o panteísmo a sério, significa que o mundo é Deus, e se acreditarmos nisso, devemos concluir que nada no mundo pode estar no lugar errado, e nada pode ser corrigido. Quando nos perguntamos o que fez o mundo dar errado, de onde tiramos a ideia de “errado”? Só pode haver algo errado se houver algo certo. Se nós despedirmos os conceitos de certo e errado, então como discernir entre “como as coisas são” e “como as coisas não são”? Se nós podemos estar iludidos sobre algo, então tem que haver algo que não é ilusão. Como poderíamos reconhecer a falta de sentido sem reconhecer o que é ter sentido? Se a vida não tivesse um sentido intrínseco, de onde surgiria o sentido de ter que dar um sentido à vida?
A mensagem da fé cristã é simples, mas não simplista. O mundo é complexo, e a fé se aplica a toda a sua complexidade. As pessoas costumam a pedir que a fé seja apresentada de um modo simples para então rejeitá-la por ser um modo simplista de olhar para um mundo complexo. Mas se apresentamos a profundidade da fé, elas rejeitam por não ser simples o suficiente para a capacidade mental da maioria das pessoas. Essas exigências servem para desqualificar qualquer sistema de crenças.
Caminhar na fé cristã não é uma coisa fácil. A fé nunca foi atraente nem agradável, ela é surpreendente e sempre exige esforço compreensivo, não importa qual seja seu nível de conhecimento. Se “ser bom” significasse apenas fazer algo que a sociedade considera bom, então não precisaríamos do Bem, poderíamos concordar com o panteísmo de Spinoza.
Muita gente pensa que o bem e o mal são apenas dois lados da mesma moeda. Mas enquanto o bem tem valor em si mesmo, ninguém ama o mal pelo mal. Nós sempre fazemos o mal com vista a um objetivo, e não pelo simples e puro ato de ser mau. Imagine a coisa mais maligna que você poderia fazer. Por mais maligno que seja seu plano, se vier alguém e mudar seu plano, você talvez diga: “Não estrague meu plano perfeito!”. O mal é apenas um modo incorreto de procurar pelo bem.
No cristianismo não há dualismo entre Bem e Mal, porque o modo de existência do Bem é diferente do modo de existência do Mal, de forma que não são dois lados da mesma coisa. Não há dualismo entre Céu e Terra, nem entre Matéria e Espírito. Essas coisas são diferentes, mas não formam dualidades, como pregava o Maniqueísmo e o Gnosticismo.
O cristianismo vê o mundo como um território ocupado pelo inimigo. Citando Lewis, “O cristianismo é a história de como o rei por direito desembarcou disfarçado em sua terra e nos chama para tomar parte numa grande campanha de sabotagem”. A igreja é um lugar para onde vamos para ouvir quais são os planos do rei para retomar o que está nas mãos do inimigo.
O atual estado de coisas está de acordo com a vontade de Deus? Se você disser que sim, então que Deus seria esse? Se você disser que não, então como pode ser que exista algo que contrarie a vontade de um ser absoluto? Este é o problema do mal, já conhecido pelos gregos 300 anos antes de Cristo. O cristianismo não se esquiva dessa pergunta. Deus nos deu liberdade para pudéssemos ter responsabilidade. Se nós não tivéssemos a possibilidade de fazer uso da liberdade para efetivar o mal, não seríamos livres. E se pudéssemos fazer o mal, mas Deus nos poupasse de todas as consequências de nossos atos, então não aprenderíamos a ser responsáveis.
Não podemos temer a palavra “autoridade”. A maior parte das coisas que acreditamos, acreditamos em função da autoridade de alguém. Não reconhecer qual é a autoridade que você está seguindo não é o mesmo que não seguir nenhuma autoridade.
Não precisamos ter medo do erro. O cristianismo não exige que sejamos impecáveis, mas pecadores capazes de nos arrepender sinceramente e mudar, fortalecendo a fé. Todo ser vivo é capaz de se ferir, mas também de se regenerar. A culpa impede que a fé se regenere depois da batalha.
Deus não ama nossa bondade, é por meio Dele que somos bons.
Não podemos dizer que Jesus foi apenas um grande mestre da moral. O que ele disse é algo completamente absurdo se saísse da boca de um simples humano. Ele disse que nos perdoa por nossos pecados. Como alguém pode nos perdoar por nossos pecados, como se fosse ele o único ofendido? Jesus não nos deixa escolha: ou ele era um lunático, ou era muito mais que um grande mestre da moral.

A moral é um modo se conduzir, ou seja, um modo de caminhar numa jornada para que seja possível chegar até seu destino. Existem três exigências da moral: 1. Que os indivíduos não entrem em colisão entre si, mas consigam conviver em paz. 2. Que o indivíduo esteja bem consigo mesmo, não entre em conflito consigo mesmo. 3. Que nós saibamos para onde estamos caminhando. Podemos fazer analogia com uma banda: 1. É preciso que você não atrapalhe os outros membros a tocar. 2. É preciso que você saiba tocar seu próprio instrumento. 3. Vocês precisam saber que música vocês estão tocando.

Uma pessoa não se torna boa pela imposição. Se o indivíduo não tem o desejo de fazer o bem, suas boas ações de pouco valerão.
 
A perspectiva do cristianismo deveria mudar muito a forma como nos relacionamos e valorizamos as pessoas. Pois se realmente acreditamos que o ser humano possui uma alma eterna, significa que ele durará muito mais do que todas as coisas transitórias que construímos nesse mundo.
 
Existem quatro virtudes cardeais:
 1. A prudência, que é pensar no que você faz. 2. Temperança, que é saber quando parar. 3. Justiça: que é não desprezar a verdade. 4. Fortaleza, que é coragem de enfrentar o mal e suportar a dor da boa escolha.
A virtude não se resume a uma lista de ações virtuosas, mas está dentro da pessoa que usa esses critérios para guiar sua ação.
É verdade que Jesus não foi o primeiro a falar dessas virtudes. Mas aparentemente ninguém quer o projeto de Deus por inteiro. Nós selecionamos as partes que queremos, e descartamos a outras. Queremos as coisas mais fáceis de fazer, mas não as coisas mais difíceis. Queremos concordar com o amor ao próximo, mas ao mesmo tempo é muito difícil colocar isso em prática.
O maior obstáculo à caridade é a insegurança quanto ao futuro. Não adianta o quanto Jesus diga que não devemos ficar ansiosos quanto ao que comeremos amanhã, parece que essa ansiedade está cada vez mais presente. A caridade cristã é diferente do projeto social voltado somente às “necessidades básicas”. Não é um projeto político de esquerda nem de direita. A moralidade social do cristianismo é atender às verdadeiras necessidades das pessoas. A paz de Cristo é bem diferente da “eudemonia” grega.
 
A fé cristã não é um tipo de psicanálise. A psicanálise pode ajudar um homem que tem medo de sair na rua, mas não o orienta para saber o que fazer quando ele sair na rua.
Deus julga por escolhas morais. Se você ainda reconhece que faz o mal, não é tão mau quanto aquele que não reconhece a diferença entre bem e mal. Só reconhecemos o quanto nós somos maus quando resistimos ao mal. Um homem que se entrega com muita facilidade ao mal não sabe qual é o seu nível de maldade. Quando resistimos ao mal é que ele se mostra com seu verdadeiro poder. Só descobrimos o grau da nossa dependência quando tentamos abandonar um vício.
A moral sexual existe em todas as culturas. A lei cristã é uma lei de amor, ela não contraria a natureza do amor. Quando nos apaixonamos por alguém, o que sentimos é real. Sentimos um desejo natural por declarar e ouvir uma declaração de fidelidade. A fé cristã exige que os amantes levem a sério aquilo que sua paixão os impele a fazer, e assumam um compromisso.
Sobre o perdão, se eu odeio meu pecado por amor a mim mesmo, então devo fazer o mesmo com os outros: odiar o pecado deles pelo mal que este pecado causa a eles mesmos.
Existem três virtudes teológicas: A humildade, a fé e a esperança.
 
O orgulho, que é falta de humildade, é o pior pecado, porque é competitivo por si mesmo. Quando desprezamos os outros por completo, estamos inundados de orgulho. Sempre que somos regidos pelo orgulho, criamos um deus imaginário, que é uma projeção de nós mesmos.
A caridade se fortalece agindo como Jesus agiu. Você só pode se importar com alguém se experimentar viver assim.
A esperança é indispensável para agir. Não podemos mudar nada no mundo se nossa esperança está na riqueza. Se nosso objetivo é obter prosperidade material, perdemos tanto este mundo quanto o Reino de Deus, porque isso significa desconfiança de que nada nos faltará se colocarmos o Reino de Deus em primeiro lugar.
Existem três vias para se lidar com a insatisfação quanto ao estado de coisas no mundo: 1. Culpar as coisas do mundo e buscar outras coisas do mundo. 2. Desistir de tudo e dizer que tudo é insuficiente, que nada neste mundo irá mudar. 3. Não se acomodar com este mundo, mas transformar a si mesmo pela renovação da mente, a fim de experimentar qual é a boa vontade de Deus.
Fé é manter-se firme naquilo que a razão já aceitou como necessidade, mas as contingências querem negar. Variações de humor e situações delicadas nos fazem duvidar de algo que tínhamos certeza, mas nos arrependemos dessa dúvida quando voltamos à razão. Por isso nos envergonhamos, pedimos perdão, e tentamos nos reconciliar com pessoas que possamos ter acusado injustamente de traição. Fé é manter-se firme numa decisão que pode parecer muito duvidosa em certos momentos, mas tem base na razão. A fé não exclui a presença da dúvida nem do questionamento acerca da verdade das afirmações e da realidade das coisas. Exemplo: Podemos ter certeza de que não há nada perigoso no escuro, e mesmo assim ter medo do escuro.
Não conhecemos a força do mal que há em nós até decidirmos enfrentá-lo. Quem enfrenta o mal faz com que ele adote estratégias mais agressivas. Ter fé é permanecer na decisão pelo bem por mais que o mal se apresente sob formas inesperadas.
Não há nada que você possa dar a Deus que ele não tenha te dado antes. Deus oferece tudo em troca de nada, e por isso não faz sentido barganhar com Deus. Ele não está exigindo que você O ame. Ele é O Caminho, A Verdade e A Vida, e amar a Deus é uma necessidade para nós, não para Ele. Deus se apresentou para ser amado para o nosso próprio bem.

 

Livro IV – Além da personalidade
O que o cristianismo tem a dizer sobre a personalidade? A teologia nos diz que nós somos filhos de Deus, mas que Jesus é o único Filho de Deus. Como pode? Ele é o Filho gerado, sempre existente. Jesus é ao mesmo tempo plenamente Deus e plenamente Homem. No Filho, não só a Divindade como a Humanidade é revelada à humanidade.
Existem dois conceitos de vida: bios e zoe, a vida natural e a vida espiritual. O cristianismo obtém conhecimento experimental sobre a zoe por meio da comunidade.
Para Deus todo tempo é agora, e Ele nunca esteve calado. Sua Palavra está ativa é por meio dela que Ele cria o mundo.
Deus é amor, mas o amor não é Deus. Todo amor emana de Deus, mas Deus não pode ser reduzido ao conjunto das emanações do amor.
A bios quer reinar sobre nós, ela quer prioridade e exclusividade. Por isso o mundo vende o pecado dando duas ou mais opções: “Você quer comprar a vista ou a prazo?”. Ficamos discutindo qual opção é melhor e esquecemos da terceira opção: não comprar.
 
Quando somos pegos desprevenidos é que revelamos quem realmente nós somos.
Ser moral é diferente de estar em Cristo. Você pode seguir toda a lei, e ainda assim Jesus exige algo que você não esperava ter que cumprir. Somos quase sempre impulsionados pelo medo. Mas a covardia é mais perigosa que a coragem, porque ela gera um ciclo vicioso. Escolher seguir Jesus é a decisão mais difícil que existe. Deus cura a doença por completo, e isso quer dizer que Ele nos cura tanto do que nos incomoda quanto do que nos agrada. Por isso é comum que alguém só venha procurar cura quando não há mais como viver com a doença. Mas na maioria dos casos não é assim, e o mundo moderno nos deu uma boa quantidade de doenças agradáveis, que nos matam aos poucos, sem que a gente perceba.
Quem não quer ser curado de tudo não quer seguir Jesus, porque santidade é diferente de bondade. Se você quer apenas aprender como ser uma pessoa melhor, não precisa de Jesus. Se aceita Jesus, significa que vai ter que aceitar que Ele tome conta da sua vida a transforme completamente, e cure aquelas doenças que você não sabia que tinha, e algumas que você até mesmo gostava de ter e chamava de bênção.
Tudo que provém de Deus se descaracteriza ao se afastar de Deus. Se tudo que nos faz ser quem somos provém de Deus, a única forma sermos autênticos é nos entregarmos totalmente para Deus. Se nós quisermos ser nós mesmos distantes Dele, não seremos mais nós mesmos. Ao nos entregarmos, Deus nos acolhe por completo, como fomos feitos para ser.
Cada aspecto que faz de você o que você realmente é foi criado por Deus. Todo aspecto inautêntico foi resultado de um afastamento em relação a Deus. Se nós ignoramos qual o sentido de nossa existência, não sabemos como viver, assim como não saberíamos o que fazer com um artefato alienígena que não se parece com nada do que conhecemos. Acabamos brincando com a vida, achando que a vida é o que que que façamos dela. Fazendo o que não deveria ser feito e agindo sem compreender o objetivo da ação. A pergunta que Deus responde é a seguinte: “Senhor, o Senhor me fez assim, me deu tudo que eu tenho, mas eu não sei o que fazer com isso. Tudo que eu tento fazer parece acabar dando errado. O que o Senhor quer que eu faça com isso, com essa vida? Eu não consegui nem sequer compreender qual a minha função. Para que eu sirvo?”.
Os pecadores procuravam Jesus porque os sãos não precisam de médico. Então não faz sentido dizer que você não pode ser cristão porque tem esse ou aquele defeito. A questão é o que você ama mais, seu pecado ou sua vida. Uma nova criatura não é exatamente uma pessoa boa, mas é uma pessoa nova, que não é mais determinada pelos fatores que condenavam a pessoa velha. Deus não quer que você seja apenas melhor, mas sim uma nova pessoa, capaz de tomar as decisões que não conseguia antes.
Não podemos privilegiar nosso próprio conceito de bom. O plano de Deus pode ser bem diferente. A transformação proposta por Deus não é exatamente uma evolução. Ela é voluntária e vem de fora da natureza.
Os cristãos serão todos iguais por serem todos imitadores de Jesus? Não. O fato de que a mesma luz incide sobre todos não faz todos serem iguais. A luz realça as diferenças, como o sal realça o sabor. Jesus pergunta: o que poderia fazer o sal voltar a ser salgado? O que poderia fazer a luz voltar a iluminar? O que poderia fazer o humano voltar a ser humano? O que pode fazer você voltar a ser você?
 
Querer ser você mesmo independente da fonte primária é querer se conformar com o resultado de incontáveis variáveis, hereditárias ou adquiridas, que não estão sob seu controle. Isso é o que realmente significa ser do mundo: estar alienado daquilo que te faz a pessoa que você é.

 

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Uma coisa pode ser moralmente errada mesmo que não faça mal a ninguém, porque não basta seguir apenas uma ou duas regras. Ou as três são seguidas, ou não chegaremos a lugar algum.
Livro III: Conduta Cristã

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