Eu sou um cara das antigas…

Sou do tempo que apelido não doía, olhe! Peninha, Coração de Papel, Zé Gordão, Seu Mim, Ôi de Bomba, Bafo de Onça, Veim, Contra Pino, Robô, Braço de Radiola, Dedo de Aço (eu mesmo) e tantos outros. Todo mundo tinha o seu.
Eu? Eu sou das antigas.
Usei calça boca de sino, US Top, sapato Vulcabrás, tênis Conga e Kichute inclusive pra paquerar na pracinha e se fosse época de parquinho ou circo, aí eu teria que dar um trato bem dado na minha Monark Barra Circular que era a onda da vez pra dar aquele roller, o cara que tinha uma bicicleta invocada já saia com uns potinhos na frente.
Eu sou do tempo em que chiclete Ploc era sucesso, o cara quando ia se encontrar com a namoradinha e era esperto levava no bolso um par deles e uma mãozada de balas de hortelã Estramite ou Pipper, aquela de sabor inconfundível. Hum! Dava um frescor na boca! E se fosse só pra curtir ainda tinha a opção das balas 7 Belo e dos pirulitos Zorro. Uau! A gente tinha que comer devagarinho pra ele não acabar de vez.
Sim, eu sou um cara das antigas…
Na minha casa tinha refrigerante Crush, Sabão de Côco, Oléo Singer, Talco Vicar, Emulsão de Scott, Biotônico Fontoura, sabonete Gessy e Alma de Flores, Leite de Colônia, Minâncora e perfume Cristal Colônia Toque de Amor da Avon. Senti até o cheiro.
Eu sou do tempo em que a gente saia de casa sem dizer pra onde ia, ate porque o destino era resolvido depois e o mais engraçado é que com um grito minha mãe me achava rapidinho – Ei Ruuuuuuubbbb!
Eu sou do tempo em que toda mãe de amigo meu era minha tia e a minha mãe, tia deles e pra alguns era até como se fosse mãe. E como elas nos tratavam bem! Ninguém precisava avisar que ia trazer um colega, dois ou três pra almoçar, sempre dava que sobrava.
Eu sou do tempo em que laranja, era fruta nobre pra se chupar sentado na calçada em volta de uma bacia cheia. Um ia descascando, outro contando lorotas e todo mundo chupando laranja e rindo. Manga a gente comia verde com sal e até com uma pitada de pimenta do reino pra dar o ponto ou madura mesmo, mas a gente traçava era com gosto, tanto que ela escorria no canto do braço até o cotovelo e que se danasse a etiqueta.
Eu? Eu sou do tempo em se começava um namoro pegando na mão e olhando pra lua como se ela fosse parceira e era, e de preferência num banquinho era comum se contar as estrelas que caiam cortando o céu, então no outro dia de manhã a gente viajava na paixonite só olhando pras nuvens que criavam as mais diversas formas conforme nossa imaginação e logo se desfaziam entre o azul celeste e o branco radiante de outras nuvens. Que viagem!
Sim, Eu sou do tempo que floricultura era o jardim da minha mãe, todo mundo dava uma muda pro vizinho. Qualquer pessoa encostava e dizia: – Dona me dê um galho dessa roseira pra eu plantar em casa. A minha mãe já tinha umas mudinhas no canto do jardim só pra dar pra quem passava e dali já nascia uma amizade.
Eu sou do tempo em que violão se aprendia na calçada olhando o mais velho tocar e todo mundo aprendia, todo mundo era tocador, todo mundo era cantor, todo mundo era artista. Nesse mesmo tempo Luiz Gonzaga fazia show com seu Trio no meio da praça cantando em cima de um caminhão no aniversário da minha cidade.
AH! Eu sou do tempo em que a banda de rock britânica Led Zeppelin ganhava o mundo, tocava nas rádios e um LP era pra quem podia. The Fevers era a banda de baile do momento. Eles não chamavam as meninas de cachorras, pelo contrário, elas eram tratadas com doçura, como princesas.
Eu sou do tempo em que coreto era o lugar onde a banda municipal tocava pra alegrar as tardes de domingo “hoje eu acordei com saudade de você…” enquanto as crianças brincavam, os jovens paqueravam e os casais de velhinhos desfilavam arrumadinhos pela praça dando boa tarde pra todos que passavam.
Eu sou do tempo em que a grande escola da vida era o lar e não uma instituição e a maior riqueza era a simplicidade, a moral. A família tinha patriarca, tinha tradição, tinha nome e sobrenome e se conhecia a graus e gerações. Era assim no meu tempo.
Eu sou do tempo. Hum! Eu sou do tempo em que os valores não tinham data de validade nem se desfaziam com o tempo. Os meus amigos daquele tempo, hoje estão mais velhos, claro! Mas continuam “velhos” e bons amigos. As histórias ficam a cada dia mais vivas e gostosas de recordar. Bons tempos!
E Deus…
Ah! Ele estava no meu tempo quando carregar um livro de capa preta debaixo do braço era sinal uma fé religiosa. Quando alguém adoecia e levantava-se um clamor em oração, Ele lá estava. Ele estava bem antes do meu tempo quando ainda não existia o lampião nem o querosene, lá Ele estava. Ele estava no começo de tudo quando tudo era nada, sem forma, um vazio e havia apenas trevas sobre a face do abismo e o Espírito dEle pairava sobre as águas. E Ele disse: haja luz e houve luz e firmamento e separação entre as águas e noite, tarde e manhã e viu Ele que tudo era bom. E criou do pó o homem e de sua costela a mulher.


O Deus do princípio é o mesmo do meu tempo, é o mesmo hoje e será o mesmo sempre.

Eu sou um cara das antigas, me dou muito bem com o presente, mas prefiro continuar com o velho ensinamento de que o melhor é deixar Deus no controle absoluto de todas as coisas e você?

Rubão é compositor, instrumentista e vocalista da Banda Cia. De Jesus
Vale a pena conhecer mais: http://rubao.org/

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