Resposta de Marina Silva ao bispo D. Moacyr


(24 de maio de 2010)
No sábado passado, a ‘Folha’ publicou reportagem com *Dom Moacyr Grechi*, 74
anos, arcebispo de Porto Velho e mentor político da senadora Marina Silva.
Para ele, não existe “nenhuma esperança de vitória. Falta nela o perfil de
presidente. Mais que perfil, a capacidade de reagir a pressão de todo o
gênero. Ela é muito frágil para aguentar”.
Amigos desde 1974, Dom Moacyr disse que Marina tem pouco “jogo de cintura”
e sua fragilidade ficou comprovada quando ela dirigiu o Ministério do Meio
Ambiente (2003-2008). “Ela vivia em uma angústia constante.”
* * *
Em artigo hoje, na ‘Folha’, Marina contesta o seu mentor.
Eis o texto dedicado “Ao amado Dom Moacyr”:

“Li na Folha (22/5) sua afirmação de que sou frágil e não tenho perfil para
a Presidência da República. No início, fiquei triste. Já tinha ouvido algo
parecido do senhor, de forma carinhosa, mas ler assim como está no jornal
tem outro peso.
Refletindo mais, reconciliei-me com sua mensagem.

Quando ando por aí, muitos me dizem que minha luta é de Davi contra Golias.
Então vamos conversar sobre passagens bíblicas, que conhecemos bem. Elas se
completam e iluminam o que quero dizer.

Quando Saul terminava seu reinado, Deus mandou o sacerdote e profeta Samuel
ungir novo rei entre os muitos filhos de Jessé. O profeta procurou entre os
mais belos, os mais fortes e os mais habilidosos, mas Deus descartou todos.
Jessé lembrou então de Davi, o seu filho mais novo, que pastoreava ovelhas.
O profeta o achou muito fraquinho, meio esquisito. Mas Deus ordenou que o
ungisse rei dos israelitas, porque olhava para o seu coração, e não para a
sua aparência.

Foi assim que Davi foi escolhido para ser rei. E logo provou seu valor ao
enfrentar Golias, o gigante filisteu, guerreiro acostumado a usar escudo,
capacete e armadura e a manejar a espada. O jovem Davi, aparentemente fraco
e sem muito preparo para aquele tipo de duelo, ganhou a luta porque não
tentou usar a armadura de Saul, que lhe fora ofertada e nem lhe cabia
direito. Usou sua própria arma, a funda, e ali colocou a pedra para jogá-la
no lugar certo, na testa do gigante.

Assim como o senhor, Dom Moacyr, Samuel era homem corajoso, temente a Deus,
preparado para o sacerdócio desde um ano de idade. O senhor é muito
importante na minha vida, da mesma forma que Samuel foi na vida de Davi. E
está me vendo com olhos cuidadosos, preocupados com circunstâncias que
talvez me causem sofrimento.

Mas, como sabe por experiência própria, não podemos ficar presos às
circunstâncias.
Quando o senhor chegou ao Acre, aos 36 anos, enfrentou os poderosos e ficou
do lado de Chico Mendes e de todos os que eram aparentemente fracos e
despreparados para enfrentar os gigantes das motosserras.

Como me ensinou, não me intimido com as circunstâncias e procuro me
encontrar com o que está no coração de homens e mulheres sinceros, que, como
o senhor, buscam fazer o melhor, apesar das dificuldades e riscos. Aprendi
com o senhor boa parte dos valores que me guiam, entre eles não vergar a
coluna às pressões dos interesses espúrios.

Por favor, meu amado irmão, não me diga agora que esses valores não servem
para governar o Brasil e me fragilizam. Tranquilize-se: eles são e
continuarão sendo a minha força e a minha funda diante dos desafios,
qualquer que seja o tamanho deles”.

MARINA SILVA

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