“Tomou as crianças nos braços... e as abençoou”
A
 narrativa em que Jesus abre espaço para as crianças, toma-as nos braços
 e as abençoa sempre surpreende. Parece que, para os pequenos, 
aproximar-se de Jesus era muito natural, pois sabiam que lá encontrariam
 um colo acolhedor. Porém, mais surpreendente é ver Jesus cercado de 
crianças e encarar os adultos dizendo que essas crianças são um sinal do
 reino de Deus e que, se nós, adultos, não nos tornarmos como elas, não 
teremos parte nesse reino. Hein? Sério? Então a questão não é apenas a 
Alice buscando o colo mais acolhedor do tio, mas as crianças, estas 
crianças anônimas, sendo acolhidas no colo de Jesus, enquanto os 
discípulos são confrontados com um desafio que se rumina sem nunca 
chegar ao fim. Nem ontem, nem hoje, como ainda é o meu caso. 
Esta
 conhecida palavra de Jesus nunca deixa de ser um mistério e um enigma: 
“Alguns traziam crianças a Jesus para que ele tocasse nelas, mas os 
discípulos os repreendiam. Quando Jesus viu isso, ficou indignado e lhes
 disse: ‘Deixem vir a mim as crianças, não as impeçam; pois o reino de 
Deus pertence aos que são semelhantes a elas. Digo-lhes a verdade: Quem 
não receber o reino de Deus como uma criança, nunca entrará nele’. Em 
seguida, tomou as crianças nos braços, impôs-lhes as mãos e as abençoou”
 (Mc 10.13-16).
Vamos
 olhar um pouco mais para este encontro entre a criança e Cristo? Um 
encontro fascinante que parece ser tão fácil que só a criança o 
vislumbra. A criança de ontem e a de hoje.
Nosso
 netinho Davi sofria de intolerância à lactose, o que sempre dificultava
 as coisas na hora da refeição e em especial nos aniversários de 
criança. Porém, um dia ele se declarou curado, e o fez com a simples 
explicação de que havia orado a Jesus e este o havia curado. E pronto! 
Simples assim.
É
 claro que eu sou tentado a dizer que a coisa não é tão simples assim e 
que há muitos fatores a considerar num quadro clínico como o dele. Para 
ele, no entanto, era “simples assim” e é isso que eu devo aprender. O 
fato é que eu não apenas reluto a aprender com o Davi, como também penso
 que ele é quem deve aprender de mim, com as minhas inúmeras divagações a
 afirmar que “a coisa não é bem assim”. Dessa forma eu mostro não apenas
 a minha incredulidade, mas também a consequente desconstrução da 
disponibilidade simples e natural dele para andar com Jesus. É que nós, 
adultos, achamos que sabemos tudo o que a criança precisa; e com a nossa
 presunção acabamos atrapalhando a relação delas com Jesus, bem como os 
discípulos fizeram. Assim as impedimos de receber a bênção vital que 
Jesus está pronto a dar a elas e a nós. 
Faz
 anos que eu acompanho a Visão Mundial, que atende milhões de crianças 
no mundo todo; e tenho feito parte dessa tendência de achar que nós 
sabemos do que as crianças precisam e que elas só têm que se colocar em 
nossas mãos. Até provemos espaço para que possam descobrir e alimentar a
 espiritualidade, mas os adultos é que decidem tudo. Por vezes, atuamos 
com a “certeza” de que nós sabemos do que as crianças precisam e as 
enquadramos em nossa pedagogia de cima para baixo. 
Pensando
 em algo mais caseiro, eu poderia referir-me à Comunidade do Redentor, 
onde ministro atualmente e onde nutrimos um projeto de trabalho com 
crianças numa área pobre da cidade. Este projeto, chamado Dorcas, é 
infinitamente menor que a Visão Mundial e é executado com menos 
sofisticação e capacidade profissional. Mas a tentação é a mesma: nós, 
membros de uma igreja de classe média, “sabemos” o que as crianças de 
periferia precisam... e lá vamos nós!
Há,
 de modo inegável, muita coisa que nós, adultos experientes, podemos 
fazer. Entretanto, o que nós pensamos saber e acabamos por fazer nunca 
deve impedir as crianças de se encontrarem com Jesus e dele receberem o 
colo e a bênção. Elas sabem que ele as espera e as recebe muito bem. 
Nesse aspecto, precisamos aprender com elas, pois carecemos do mesmo 
acolhimento.
O
 evangelista Mateus aprofunda ainda mais este desafio e mistério e 
mostra Jesus dizendo sem papas na língua: “Eu lhes asseguro que, a não 
ser que vocês se convertam e se tornem como crianças, jamais entrarão no
 reino dos céus. Portanto, quem se faz humilde como esta criança, este é
 o maior no reino dos céus” (Mt 18.3-4).
Assim
 como as crianças, nós precisamos nos encontrar com Jesus. Elas nos 
ensinam o caminho. Porém, para podermos percorrê-lo, precisamos nos 
converter; e essa conversão que “nos torna como crianças” só é possível 
por meio da humildade. Uma humildade que não apenas reconhece que não 
sabe o que a criança precisa, mas também se dispõe a seguir atrás dela 
nessa busca faceira rumo ao colo de Jesus e sua bênção. A bênção que nos
 leva a vislumbrar a realidade do mistério do reino de Deus.
• Valdir Steuernagel
 é pastor na Comunidade do Redentor, em Curitiba, PR. Faz parte da 
Aliança Cristã Evangélica do Brasil, da Aliança Cristã Evangélica 
Mundial e da Visão Mundial.
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