Igreja x “Denominações”

O termo “denominação” não aparece nas Sagradas Escrituras, nem no Antigo nem no Novo Testamentos. É também um termo desconhecido nos textos dos Pais da Igreja e dos Reformadores, bem como dos Concílios da Igreja Indivisa. Não é um termo teológico e, sim, sociológico e surge apenas no espaço do Protestantismo. Ele tem como pano de fundo a eclesiologia congegacionalista, com seu conceito localista e reducionista de “igreja” (= comunidade local), bem como a percepção de que a igreja dita “invisível” não é igual a nenhuma instituição eclesiástica, mas se encontra presente em todas elas. Em sendo assim, um grupo de cristãos com algumas características peculiares deve ter um “nome”, ou seja, se de-nominar, ser chamada por um nome, que o diferenciaria de outros, com outras peculiaridades e outros nomes.

O termo “denominação” apenas vai se consolidar a partir do século XVIII nos Estados Unidos, e se dá o nome de“denominacionalismo” à proliferação de “denominações”, que se dá, principalmente no século XX.

Desse modo, se pode perceber três sentidos para o termos “denominação”:
  1. O nome que se dá a um dos ramos do Protestantismo (batistas, metodistas, etc.);
  2. O nome que se dá a uma das organizações desse ramo (Convenção Batista Brasileira, Convenção Batista Nacional, etc.);
  3. As características peculiares desses ramos do Protestantismo (metodismo, presbiterianismo, etc.).

O que encontramos nas Sagradas Escrituras e na Tradição apostólica é o termo Igreja. Essa, em seu sentido maior, significa a universal assembleia dos remidos. Com a consolidação missionária no final do século I e século II, um conjunto de “igrejas” (comunidades locais), vai formar uma Igreja (Diocese) regional, com um Bispo, como presidente, seus Presbíteros e Diáconos dirigindo as comunidades locais, juntamente com o laicato. Um conjunto de Igrejas Diocesanas forma, então, uma Província Eclesiástica em uma região ampliada. Nessa época não se falava em “Igreja invisível” vs.“Igreja visível”, mas em “Igreja triunfante” (os já na glória) e “Igreja militante” (os ainda na História). Esse Corpo Místico de Cristo constitui a sua Igreja, com as marcas da unidade, da santidade, da apostolicidade e da catolicidade (universalidade): Una, Santa, Católica e Apostólica.

Os Bispos das capitais passaram a ser chamados de “metropolitas” (bispos de uma metrópole), e os Bispos das cidades mais importantes passaram a ser chamados de Patriarcas (Pais): Jerusalém, Alexandria, Antioquia, Constantinopla, Roma. Particularmente essas duas últimas capitais, respectivamente, do Império Romano do Oriente e do Ocidente. Essas igrejas regionais se expandiram além de suas regiões, com pretensão de universalidade e de singularidade: ser a “verdadeira”igreja, bem como de associar a sua igreja com o todo, e tudo mais como círculos concêntricos distanciados e externos.

Durante a Reforma Protestante essas pretensões de Roma e de Constantinopla (Bizâncio = bizantinos) foram rejeitadas, mas se afirmou o conceito de “igrejas nacionais”, que fora comum em um estágio da História e mantido por igrejas do Oriente (Igreja Siriana, Igreja Antioquina, Igreja Armênia), assim tivemos expressões como a Igreja da Suécia (Luterana) ou a Igreja da Inglaterra (Anglicana). Vale salientar que ao final da Reforma, se somando Oriente e Ocidente, inclusive o Protestantismo, não havia mais do que uma dúzia do que então se chamava de “ramos do Cristianismo” (ramos não-reformados e ramos reformados).

A concepção protestante histórica do Anglicanismo fez com que nos afirmássemos como “uma parcela provisória da Igreja de Cristo”. Não usamos o termo “denominação” (desconhecido no século XVI), rejeitamos a concepção institucional-universal de Roma e de Bizâncio, afirmando o princípio reformado de uma “parcela” ou um “ramo” do todo da universal assembleia dos remidos, encontrado em todos os ramos (ao lado dos respectivos “joios”...).

Diante do evidente fato do denominacionalismo protestante ocidental contemporâneo, e da popularização do termo“denominação” inclusive na academia (Sociologia da Religião), nós o usamos sociologicamente e não teologicamente, por uma questão de comunicação, embora não faça parte do nosso vocabulário, nem dos nossos conceitos teológicos.

Nesse sentido sociológico, “Anglicanismo” seria uma denominação, por seu “nome” pelo qual somos conhecidos e por ser um dos “grupos” reformados com suas peculiaridades (governo, liturgia, doutrinas periféricas, etc.). “Comunhão Anglicana”seria um conceito denominacional mundial, como “Igreja da Inglaterra” seria um conceito denominacional nacional e“Diocese do Recife” um conceito denominacional regional e Paróquia Anglicana do Semeador um conceito denominacional local.

Diocese do Recife, histórica, conceitual, organizacional anglicana, parte de uma organização mundial (Comunhão Anglicana), sob a Autoridade Primacial de uma organização regional (Igreja Anglicana no Cone Sul da América) e em mútuo reconhecimento com outra organização regional (Igreja Anglicana na América do Norte), em virtude do processo histórico e divergências de fundo, está desvinculada de uma organização regional (Igreja Episcopal Anglicana do Brasil), não integrando mais essa “denominação’”, se constituindo, em nomenclatura e sociológica e juridicamente em outra“denominação”, que de regional (Nordeste) se projeta nacionalmente (Brasil), e que deve ter um nome (“denominação”) que reflita essa realidade, sem deixar de ser conceitualmente a mesma “denominação”: Anglicana.

Paripueira (AL), 30 de junho de 2010,
Anno Domini.
+Dom Robinson Cavalcanti,

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