Entrevista Leonardo Gonçalves

JORNAL EXTRA – Você está para lançar o DVD ‘Sublime’ no próximo mês. Conte-nos mais sobre o projeto...
LEONARDO GONÇALVES – A gente gravou no ano passado. A previsão é que o lançamento seja em agosto. A gente lançou a música ‘Sublime’ antes, como é de costume, depois será lançado todo o DVD. Eu gosto muito dessa música porque ela foi composta pela minha esposa, a Daniela Araújo, e é a abertura do disco. A primeira música da noite foi ela. Vai sair o CD também. O DVD em si tem músicas inéditas, mas também músicas de cada CD, como o ‘Princípio e Fim’, ‘Viver e Cantar’, ‘Poemas e Canções’, que lembram toda nossa jornada até aqui.

JORNAL EXTRA – Atualmente, a Música Cristã, ou Gospel, tem recebido muita evidência e também muitas críticas. Qual sua análise sobre esse cenário?

LEONARDO GONÇALVES – Como você mesmo disse na pergunta, quanto mais evidência uma coisa tiver, mais críticas ela vai sofrer. Isso parece que é lei na sociedade humana. Um dos melhores exemplos disso é a Seleção Brasileira. A gente acabou de sair de uma Copa do Mundo e a atenção de todos estava voltada para a Seleção. A tensão em torno do objetivo de ganhar a Copa aumentou. Então, com o crescimento da quantidade de evangélicos no Brasil – estima-se que nos últimos 20 anos mais que triplicou o número de evangélicos no país. Em 1994, não chegava a 10 milhões de evangélicos, hoje, pelo IBGE, são 44 milhões. Do ponto de vista da música, tudo acaba alcançando outras proporções – não só do lado da música, mas também na música. Tem um diferencial, que a Música Cristã envolve a música evangélica e a música católica e a Música Gospel é a evangélica, mesmo. Hoje, a Música Cristã é um dos maiores segmentos no Brasil, em termos de vendas de discos. Isso tem a ver com o fato de que dentro do contexto religioso, pirateia-se menos, há menos download ilegal. Então, não é que hoje esses cantores sejam mais conhecidos do que cantores de outros segmentos, como o sertanejo, por exemplo, mas é porque a pirataria afeta menos esse segmento em particular.

JORNAL EXTRA – Sua música tem características bem peculiares. Como você tenta se posicionar nesse ambiente?

LEONARDO GONÇALVES – De maneira geral, existem duas maneiras sobre como se posicionar: a favor do ‘status quo’ e contra o ‘status quo’. Isso se trata de tudo, seja na pregação, na arte, ou até no humor. Dentro dessa sua pergunta, por mais que eu fique muito feliz com toda essa atenção, com todo esse crescimento, creio que seja minha tarefa questionar um pouco isso. Viver o que Jesus viveu é diferente do que professar uma fé cristã. Eu acho que o meu foco é levar as pessoas a viver, de fato, como Jesus viveu. Procuro colocar isso nas minhas músicas, mas também nas redes sociais, na minha maneira de me relacionar com as pessoas. O mercado existe porque existem pessoas interessadas. Em si, isso não é uma coisa ruim. Porém, você pode levar as pessoas a refletirem sobre o seu estado, no que ainda falta para serem verdadeiras discípulas de Cristo, ou você leva uma mensagem vazia, mas que as dê motivação. Eu fico com a primeira opção, sem sombra de dúvidas. É um caminho um pouco mais pedregoso, você falar o que as pessoas não querem ouvir. Mas acho que não há outra maneira de fazer. Ou você apoia as relações de poder como estão ou você as questiona. Ao questionar, você tem de questionar o próprio indivíduo.

JORNAL EXTRA – Então, qual sua opinião sobre os cantores religiosos que cobram cachês milionários para fazer apresentações?

LEONARDO GONÇALVES – Então, existe a parte do mercado. Vou dar um exemplo que eu sei. Em 2006, 2007, foi o auge do cantor baiano Irmão Lázaro. Eu lembro que ele fez um evento muito grande em Manaus e duas semanas depois eu estava em Manaus, cantando. Ali, naquele evento, tinha 50 mil pessoas, cada uma pagando R$ 20. Estamos falando de um evento que, só de bilheteria, foi R$ 1 milhão. Se ele cobrou R$ 100 mil – e ele não cobrou R$ 100 mil –, ele não ganhou 10% do que o evento apurou de bilheteria. Muitos olham para quanto o artista cobra, mas não olha para quanto o produtor recebe. Se tem gente pagando certos cachês, é porque vale a pena. Esses mesmos artistas que cobram cachês muito altos, quando vão cantar em igrejas, não cobram o mesmo valor. É outro tratamento. Às vezes, a gente tem a impressão que um cantor cobrou R$ 50 mil para cantar em uma igreja. Não é esse o caso. Ele cobrou isso para cantar em um evento, que terá ingressos, e que renderá muitas vezes mais. Então, existe a parte do mercado. Se você vai cantar para uma plateia de 20 mil ou 30 mil pessoas, é até obrigação do artista cobrar um cachê razoável para ele se valorizar. Agora, como manter a pureza ministerial dentro desse mercado? Como manter o espírito de serviço, que é o que Jesus pregou, principalmente no Sermão do Monte (Mateus 5 a 7)?. Por exemplo, se eu não cobro o mesmo que esses artistas cobram, é porque os eventos em que participo não têm uma máquina de mídia por trás, o que não junta tantas pessoas. Eu acredito que da mesma maneira que eu tenho meus projetos pessoais, que eu devo investir, tenho causas que eu quero divulgar, minha maneira de ofertar, dizimar e lidar com aquilo que D-S me deu, com responsabilidade, zelo e oração, gosto de acreditar que cantores como Aline Barros, André Valadão e Thalles Roberto façam a mesma coisa. Alguns eu até sei de alguns projetos de assistência social que eles investem bastante tempo, bastante dinheiro, sua imagem, quer seja orfanatos, conscientização sobre tráfico de pessoas. O Irmão Lázaro, que eu mencionei no início, sustenta uma casa de recuperação de drogas sozinho, e ele não fica divulgando isso, pois o que a mão direita faz a esquerda não precisa saber. Agora, de algumas coisas não tem como fugir, no sentido de que estamos em um mundo capitalista onde se ganha em cima da visibilidade de certas pessoas ou tipos de programação. Mas isso não se restringe só a quem trabalha com ministério. A própria Bíblia nos previne e nos auxilia sobre como lidar com o dinheiro, que deve ser usado para a Glória dAquele que é dono de todas as coisas. Acho que isso também serve para o médico, para o advogado, para o professor, para qualquer profissional. Ou você faz para engrandecer a Cristo ou você faz em benefício próprio. No meio cristão, eu quero acreditar que a opção de fazer para engrandecer a Cristo seja a mais comum, embora eu saiba que não é.


JORNAL EXTRA – Há alguns anos, você revisitou a origem judaica. Conte-nos um pouco dessa experiência...

LEONARDO GONÇALVES – Bem, eu nasci em Palmares-PE. Em Pernambuco, tem muita gente com ascendência judaica. Muitos judeus vieram para cá. Aliás, a primeira sinagoga nas Américas é a do Recife, muito antes dos judeus irem para Nova Iorque – uma das cidades onde mais tem concentração de judeus, fora Israel. Mas muito antes de os judeus irem para lá, vieram para o Brasil, em particular para Pernambuco. O avô do meu avô era judeu. Ele faleceu quando meu avô tinha 8 anos de idade, então era uma coisa da qual ele não tinha muita memória. Mas existe um projeto da Igreja Adventista chamado Beth B'nei Tsion, que em português é Casa dos Filhos de Sião, que são os templos judaicos-adventistas, para que as pessoas mantenham suas origens judaicas, embora seja uma Igreja Adventista normal, ligada à Associação. Então, levei o meu avô comigo uma vez para assistir um culto lá comigo e ele se emocionou por se lembrar de muitas coisas que ele havia aprendido com o avô. O jeito que foi enterrado, as roupas, as orações, vários detalhes. Antes disso, meu pastor, Edson Nunes, que foi meu pastor de hebraico no Unasp já falava que eu tinha de gravar um CD em hebraico. Depois que eu descobri que tenho ascendência judaica, como ele também tem, decidi gravar esse disco, Avinu Malkenu, que foi lançado em 2010 e, para mim, foi motivo de grande alegria, resultado de uma procura minha em busca de minhas raízes. Eu gosto muito de ouvi-lo. Ele tem um significado muito especial para mim.

JORNAL EXTRA – O Judaísmo é uma religião cujos rituais são muito voltados para a família. Você acha que esse é um dos aspectos que os cristãos precisam aprender com os judeus?

LEONARDO GONÇALVES – Na verdade, eu vou responder sua pergunta de um modo completamente diferente. Muito se fala da bênção de Abraão sobre o povo judeu. Hoje há 14 milhões de judeus no mundo e praticamente em todas as áreas eles têm representantes na liderança, seja em Hollywood, na parte do entretenimento, comediantes, nas ciências – Freud era judeu, Einstein era judeu, Karl Marx, que é tido como fundador do comunismo, era judeu. Muito se fala sobre a bênção de Abraão até os dias de hoje. Sem querer desmistificar e diminuir a bagagem espiritual dessa bênção, mas a minha interpretação sobre ela é muito simples. Desde criança, eles aprendem que são um povo escolhido por D-S e que para representá-Lo é necessário fazer o seu melhor, não importa em qual área. A criança cresce aprendendo que é especial e precisa levar, através da postura dela, a grandiosidade de ser bênção. Agora, coloca cinco mil anos de estrada, você tem um povo como os judeus. Sem sombra de dúvida, essa bênção está disponível para todos nós, em Cristo Jesus nós nos tornamos coerdeiros dessa metodologia de educação. Até a Educação Adventista Mundial tenta acumular isso, mas nós não temos os cinco mil anos de bagagem deles (risos).
Minha avó foi nascida e criada na periferia do Recife, teve uma infância muito difícil, muito pobre. Só conseguiu fazer o Supletivo porque se casou cedo. O marido era vendedor itinerante, que comercializava enciclopédias pelo Nordeste. Ela fez o Supletivo na Escola Adventista. Ela teve quatro filhos. Mas, por causa do valor que ela dava à Educação, os quatro filhos dela têm mestrado. Isso mostra o poder da Educação, de que a criança deve e pode representar a D-S em seus atos, fazendo o seu melhor, não importa onde. Não é fácil, haverá momentos em que você vai ser passado para trás, por não querer ser desonesto, mas a real é que compensa. Não só na questão da Eternidade, mas se você é generoso, as pessoas serão generosas com você. Se você é trabalhador, será reconhecido de alguma maneira.


JORNAL EXTRA – Você nasceu em Palmares, mas se mudou ainda bebê. Mesmo assim, qual sua relação com a cultura nordestina?

LEONARDO GONÇALVES – Aprendi muito da cultura nordestina com minha família. Minha mãe, as irmãs dela, minha avó. Eu sou mais ligado à família da minha mãe, até porque meus pais se separaram quando eu tinha 1 ano de idade e eu passei mais tempo com a família da minha mãe. Lá, é todo mundo pernambucano. A comida, a sotaque, são coisas com as quais eu cresci. Então, para mim, o Nordeste é família. Inclusive, essa é a parte da minha família que está mais envolvida com música – Williams Costa Jr., Sonete, Marcelo do Novo Tom. E, ainda, eu fui casar com a Daniela Araújo. Ela nasceu em São Paulo, mas tanto o pai quanto a mãe dela são do Piauí. Tanto a minha família por parte de mãe, que é a que eu tenho mais contato, quanto a família dela inteira, por parte de mãe e de pai, é tudo nordestino. Então, é uma festa, tanto com a minha família quanto com a dela. Então, é sempre uma alegria estar aqui no Nordeste.
Agora, assim, eu aprendi a andar em Garanhuns. Nasci em Palmares, depois me mudei para o Rio de Janeiro, para a Bahia... meu primeiro ano foi muito conturbado, pois foi a época em que meus pais estavam se separando. Depois que eles se separaram, a gente veio morar em Garanhuns, onde dei meus primeiros passinhos. Tenho muitas boas memórias daqui.

JORNAL EXTRA – Muitos ficam em dúvida se você é um tenor com extensão de barítono ou um barítono com extensão de tenor. Você pode esclarecer isso para a gente?

LEONARDO GONÇALVES – Então... Quem cuida da minha voz é a doutora Blacy Gulfier, que tem doutorado em Medicina pela USP, na área de voz. Ela é realmente uma especialista na área. A classificação vocal tem de seguir um método, e ela utilizou um método norte-americano, e a minha classificação vocal é inconclusiva (risos). Eu poderia ser considerado um barítono com extensão de tenor ou um tenor com extensão de barítono. Dentro dessa metodologia, que é a mais utilizada para a classificação vocal no mundo, eu não me encaixo (risos)

Jornal EXTRA
Jénerson Alves - jornalista
CRÉDITO DAS FOTOS: ANDREZA FERREIRA

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