ESPECIAL - O Jesus do evangelho não é mártir!


Resultado de imagem para JESUS CRUZJesus não pode ser colocado ao lado de João Batista, de Estevão nem de Tiago, que foram mortos por suas crenças e pregações. Não pode ser colocado ao lado de Policarpo, daqueles sete homens e cinco mulheres do norte da África, daqueles 222 missionários cristãos da China e da Coréia nem daqueles 26 religiosos da Espanha, que perderam a vida por sua fidelidade ao evangelho. Não pode ser colocado ao lado de todos que têm morrido nestes últimos anos por causa de sua posição contrária à discriminação e à opressão, como Mahatma Gandhi, assassinado em 1948, aos 79 anos, e Martin Luther King, morto em 1968, aos 39 anos. 

Precisamos corrigir imediatamente qualquer discurso e qualquer música que ainda chamem Jesus de mártir, como aquela que diz que “Ele veio ao mundo pra ser mártir da paz”. 

Mártir é aquele cuja morte é imposta de modo irreversível por religiosos, autoridades e indivíduos de crenças opostas e intolerantes. O mártir só escapa da morte se voltar atrás e negar sua fé, nem que seja no último instante da vida, à semelhança de André la Fon, aquele alfaiate calvinista que foi poupado por Nicolau Durand de Villegaignon de ser estrangulado e jogado na Baía de Guanabara, em fevereiro de 1558. 

É irreverência e heresia chamar Jesus de mártir. Esse infeliz procedimento diminui a sua glória e confunde tudo. O próprio Jesus Cristo deixou claro várias vezes que Ele não seria morto por vontade seja lá de quem fosse. O texto mais contundente é aquele em que Ele afirma categoricamente: “Ninguém tira a minha vida de mim, mas eu a dou por minha própria vontade. Tenho o direito de dar e de tornar a recebê-la. Foi isto o que meu Pai me mandou fazer” (Jo 10.17-18, BLH). A morte de Jesus é uma doação, como Ele mesmo declarou: “Eu sou o bom pastor: o bom pastor dá sua vida por suas ovelhas” (Jo 10.11, BJ). 

Jesus sempre correu risco de vida, mas nunca morreu, senão quando Ele mesmo “derramou a sua alma na morte” (Is 53.12). Livrou-se de todas as tentativas de morte que lhe armavam, a começar com a de Herodes, o Grande, que mandou matar todas as crianças do sexo masculino de idade inferior a 2 anos residentes em Belém e seus arredores, na certeza de que uma delas seria o recém-nascido menino Jesus (Mt 2.13-18). A essa altura, a criança já estava no Egito. Em outra ocasião, só porque Jesus informou que era anterior a Abraão, os judeus “apanharam pedras para atirar nele, mas Jesus ocultou-se e saiu do templo” (Jo 8.59). 

A história é coerente o tempo todo. Em um momento de angústia, semelhante ao outro que teria pouco depois no Getsêmani, Jesus desabafa: “Agora meu coração está perturbado, e o que direi? Pai, salva-me desta hora? Não; eu vim exatamente para isto, para esta hora” (Jo 12.27). E, quando chega a hora de dar sua vida pelas ovelhas, Jesus não foge, não se esconde, não se oculta, não recorre a milagre algum, não pede ao Pai o concurso de legiões de anjos nem permite que Pedro faça uso da espada (Mt 26.47-54). Agora, apenas agora, Ele deixa as coisas acontecerem naturalmente. E ainda corrige Pilatos, quando este presunçosa e ignorantemente lhe dirige a seguinte ameaça: “Não sabes que eu tenho poder para te libertar e poder para te crucificar?” (Jo 19.10). A resposta de Jesus é imediata e explícita: “Não terias nenhuma autoridade sobre mim, se esta não te fosse dada de cima” (Jo 19.11). 

Jesus não é mártir porque a morte dele foi voluntária. Ele tinha completa liberdade diante da morte. 

A morte espontânea de Jesus tornou-se necessária por causa do pecado. Ele tomou livremente sobre si o pecado de muitos (Is 53.5-12) e tornou-se, então, culpado de pecado. É como muito bem explica Paulo: “Deus tornou pecado por nós aquele que não tinha pecado [Jesus], para que nele nos tornássemos justiça de Deus” (2 Co 5.21, NVI). Em outras palavras, “Deus tornou Cristo solidário com o gênero humano pecador, a fim de tornar os homens solidários com a sua obediência e a sua justiça” (A Bíblia de Jerusalém, p. 1.513). 

Aí está a base do perdão, da justificação, da nossa paz com Deus. A salvação é gratuita para aquele que crê e se beneficia do sacrifício de Jesus, mas não é gratuita para Ele. Daí a lembrança de Pedro: “Vocês sabem que não foi por meio de coisas perecíveis como prata e ouro que vocês foram redimidos da sua maneira vazia de viver que lhes foi transmitida por seus antepassados, mas pelo precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro sem mancha e defeito” (1 Pe 1.18-19). Pode parecer muito estranho, mas, na verdade, Jesus foi castigado em nosso lugar. Tanto o profeta Isaías como o apóstolo Paulo, cada um a seu tempo, asseveram a mesma coisa. O primeiro, sete séculos antes de Cristo, explica que “O castigo que havia de trazer-nos a paz caiu sobre Ele, sim, por suas feridas fomos curados” (Is 53.5, BJ). O segundo, alguns anos depois de Cristo, argumenta: “Aquele que não poupou a seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós, como não nos dará, juntamente com Ele, gratuitamente todas as coisas?” (Rm 8.32, NVI). Agora é mais fácil entender o brado de Jesus na cruz, citado por Mateus (27.46) e Marcos (15.34): “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” 

Quem considera Jesus um mártir é obrigado a reduzi-lo a um personagem simplesmente histórico, sem nenhum traço de divindade. Nesse caso, Jesus nasceu de Maria e José ou outro homem qualquer. Não é o Jesus do Evangelho e de todas as Escrituras Sagradas. Não é o Verbo feito carne, cheio de graça e de verdade. Não é o Agnus Dei, de que fala João Batista (Jo 1.29). Não é o Ressuscitado. Nem tampouco aquele que foi assunto ao céu, onde se encontra à direita de Deus. Também não é o Jesus de que todos precisávamos, já que “é impossível que sangue de touros e bodes tire pecados” (Hb 10.4). 

É bom que fique terminantemente assentado: o Jesus do Evangelho, o Jesus propriamente dito, o Jesus original não é e nunca foi mártir. O clero católico, ortodoxo e protestante precisa instruir o povo a este respeito, repetidas vezes, com convicção e autoridade, até acabar por completo com essa idéia popular de um Jesus mártir!

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