"Precisamos provar que não somos gueto"

Poucos temas geram debates tão acalorados quanto a mercado de livros cristãos para autores nacionais.   
A reclamação generalizada é de que há pouco espaço para novos escritores. Já as editoras reclamam da falta de qualidade. Quem está com verdade? Apesar de trabalhar diretamente no segmento há apenas alguns meses, o jornalista Ricardo Alexandre, de 37 anos, é especialista no assunto. 
Novo Editor e Autores Nacionais da Mundo Cristão, uma das principais editoras evangélicas dpaís, esse batista de Jundiaí (SP) tem uma longa carreira na imprensa, com diversos trabalhos na área de cultura. Foi repórter e crítico do jornal O Estado de São Paulo, redator-chefe da revista Bizz e diretor de redação de Época São Paulo. No ano passado, foi dele a reportagem de capa para a semanal Época, intitulada A nova reforma protestante. 
Os meses em que trabalhou na matéria o aproximaram do mercado editorial evangélico. Agora, ele trabalha para lançar obras que dialoguem com a sociedade. “O custo para emplacar novos autores nacionais é alto e não vejo grandes mudanças a curto prazo. Mas queremos estabelecer um novo padrão de excelência, que outros possam buscar”, aposta.     
CRISTIANISMO HOJE – Fala-se muito da falta de espaço para novos autores nacionais no mercado cristão brasileiro. Por que a situação é tão difícil? 
RICARDO ALEXANDRE – Na verdade, não há tantas dificuldades em publicar livros. Difícil é alcançar o leitor.É fato que existem hoje mais editoras do que livrarias no Brasil. Quanto a publicar um livro, se o escritor não consegue uma editora, pode optar por fazer uma edição do autor. E, no mercado cristão, com livros de pequena tiragem, os autores têm grande vantagem em relação aos do meio secular: a inserção na comunidade à qual estão filiados. Igrejas são um público certo.     
Ainda assim, o espaço para obras estrangeiras é incomparavelmente maior. O que acontece? Falta talento no Brasil?  
O problema não é esse. Acredito que essa “desproporção” exista, primeiro, por causa do tamanho dos mercados internacionais em relação ao brasileiro. São muito maiores. Lá fora, as pessoas também leem mais. Há mais títulos, autores, cujos nomes são mais conhecidos, e que são mais fáceis de vender. Isso faz diferença, pois os temas da espiritualidade cristã, preferidos pelos escritores brasileiros, são universais – servem tanto nos Estados Unidos quanto aqui. Além do mais, no Brasil, o volume de vendas é muito pequeno se comparado com o de outros mercados. Livros são difíceis de escrever. Já publiquei dois. Levei seis anos para escrever o primeiro e outros dez para o segundo; então sei o que estou dizendo.     
A curto ou médio prazos, você imagina alguma mudança nesse cenário? 
Infelizmente, não acredito que venha a acontecer. A Igreja evangélica que cresce no Brasil não é aquela que gosta de ler e estudar bastante – é a que prefere bênçãos e revelações. Ainda assim, editoras como a nossa têm procurado diminuir esse abismo. A criação do cargo que ocupo é uma tentativa de valorizar aquilo que é produzido no país. O custo para emplacar novos autores nacionais é bastante alto, mas esse investimento é essencial para a expansão do Reino de Deus em qualquer nação, pois permite o desenvolvimento de lideranças e a maior identificação com a Palavra.     
O que deve fazer um autor principiante que queira publicar seu livro?
Primeiro, pensarem temas relevantes e contextualizados à nossa realidade; temas urgentes e que a espiritualidade cristã possa iluminar. Recebemos pouquíssimas propostas assim, e menos ainda que tenham apelo. A maioria prefere temas batidos. Se o autor resolver analisar o Sermão do Monte, terá contra si uma competição desleal. Além disso, ele não deve pensar em fazer livro de qualquer jeito, no tempo que lhe sobra. Deve procurar um nível de excelência bíblico. Ficção no nível de João Ubaldo Ribeiro, jornalismo para ganhar prêmio secular. Precisamos provar que não somos gueto, que temos luz para iluminar, como Cristo manda, toda a sociedade.
cristianismo hoje

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