Kaká fala sobre sua relação com Deus fora da igreja

Na conversa com a jornalista Sonia Racy, do jornal O Estado de S. Paulo, Kaká afirmou que atualmente sua relação com a religião é “muito ligada a Jesus só”.


O jogador Kaká concedeu uma entrevista e comentou sua forma de olhar para a questão religiosa. Ex-membro da Igreja Renascer, o meia-atacante diz que se inspira em Jesus e que lê a Bíblia com frequência como forma de entender a proposta do Evangelho.


Na conversa com a jornalista Sonia Racy, do jornal O Estado de S. Paulo, Kaká afirmou que atualmente sua relação com a religião é “muito ligada a Jesus só”, por entender que é a melhor maneira de praticar a fé: “Sou um cara que ama a Bíblia, tenho Jesus como meu exemplo. Então, faço as minhas orações. Tenho a Bíblia no meu telefone e estou lendo muito os Evangelhos ultimamente, para entender um pouco mais de Jesus e das coisas que ele fazia, como fazia e por que fazia”.

Questionado se ficou decepcionado com os evangélicos, Kaká negou: “Não, fiquei muito tempo na Renascer, frequentei a igreja, mas chegou um momento em que achei que era hora de me desligar da instituição. A gente tem uma ótima relação com eles”, disse, em tom bastante diplomático, e fazendo referência aos dirigentes da denominação, apóstolo Estevam Hernandes e bispa Sonia Hernandes.

Sobre bebidas alcoólicas, Kaká disse que se abstém por questões pessoais e profissionais: “Não gosto. Até falei com as nutricionistas para saber se alguma delas via benefício na bebida. Eu não gosto, mas, se me dissessem que tomar uma cerveja faz bem, por exemplo, até tomaria. O engraçado é que morei em dois países onde o vinho é parte da cultura. Com a Carol, até fiz um curso, que foi muito legal”, revelou.

A jornalista, curiosa em compreender como alguém que não bebe se saiu num curso sobre vinhos, perguntou como foi a experiência. Bem humorado, Kaká respondeu: “Mas eu bebia [no curso]. Se abrir uma garrafa, eu tomo, mas não é algo que faça por prazer. No curso, a professora perguntava: ‘Por que vocês estão aqui?’. A maioria respondia: ‘Ah, eu gosto de vinho’ ou ‘eu tenho uma adega’. Já eu falei: ‘Queria descobrir por que não gosto de vinho’. Todo mundo começou a rir”, disse ele.

Confira abaixo a entrevista na íntegra:

Pelé declarou que sentiu falta de nomes como o seu e o do Robinho, por serem mais experientes, na seleção. Como é ser lembrado por Pelé?
Muito legal. Mas devo dizer também que muita gente achava que eu não devia ser convocado. Fiz o que pude para ser: troquei o Real Madrid pelo Milan, ganhando menos, porque achava que poderia voltar a jogar bem e ser convocado. O que não dependia de mim ficou para a escolha do treinador.

O treinador errou? Faltou gente com experiência?
Na hora que perde, todo mundo começa a procurar motivo. Acho que é uma boa receita misturar juventude e experiência. Nos clubes pelos quais passei e em momentos que tive grande sucesso, houve essa mistura. Mas não significa que tinha de ser eu a estar lá.

Como você se compara com o Kaká de dez anos atrás?
Muito mais maduro e mais paciente. As coisas acontecem muito rápido no futebol. Em uma semana, você é o melhor; na outra, é o pior. Vai do céu ao inferno. Faço o que tenho de fazer.

O que acha que aconteceu com a seleção?
É muito difícil especificar. Todo mundo tem falado que é inexplicável, e eu concordo. Tomar sete gols em uma semifinal de Copa? Tanto que são números que entraram para a história.

Apagão coletivo?
Claro que é coletivo, são 11 em campo. Você pode falar que foi erro de posicionamento, a parte emocional, um jogador que errou uma bola, que cometeu um erro técnico. Está claro que foi por um conjunto de fatores.

Você não culpa o Felipão?
Não. É claro que, em um erro coletivo desse tipo, o técnico, como líder, tem de vir a público dizer que a culpa foi dele. Mas não gosto muito disso, de você falar que o cara foi o culpado. Não dá. Não gosto disso nem no individual também.

Qual o segredo do sucesso da Alemanha? Disciplina?
A parte tática do time é muito boa, de organização em campo. Quando estou há muito tempo jogando com os mesmos atletas, as coisas ficam automáticas. Em campo, é tudo intuitivo, e essa intuição vem da memória muscular, de treino. Se eu treino muito a mesma situação, sei o que fazer na hora em que aquela oportunidade aparece no jogo.

De que outras seleções você gostou na Copa?
A Argentina foi um exemplo disso também. Assisti à semifinal, contra a Holanda, e também à final. O time estava muito bem organizado. Além de Argentina e Alemanha, gostei da Costa Rica, da Colômbia e do México. São times sem um craque. A própria Alemanha. Não tem um Messi, um Cristiano Ronaldo, um Neymar. É tudo no coletivo.

É a favor de que os times se tornem empresas?
Sou a favor de uma melhor gestão dos clubes. Porque dá uma transparência maior.


Por que o Brasil ainda não conseguiu chegar a esse estágio?
Por causa do forte sistema do futebol brasileiro, muito enraizado em alguns paradigmas antigos. Nosso futebol precisa melhorar muito em todos os aspectos. E um desses aspectos é o da gestão dos clubes. Precisamos ser mais profissionais.

O que você mudaria na CBF?
Ela poderia ser uma instituição mais ligada à seleção. Lá fora, há as ligas, que comandam o campeonato e os clubes. Já a federação é responsável pela seleção e pertence ao governo.

Acha, então, que o governo deveria ter mais participação?
Não.

Na Alemanha, o técnico Joachim Löw fracassou, foi mantido e, agora, conquistou o título. Falta planejamento no Brasil?
É preciso planejamento para curto, médio e longo prazos. A gente vive num mundo imediatista – não só no futebol, tudo hoje tem de ser imediato, tem de ser agora. Em todos os aspectos, inclusive político. 

O que acha do acompanhamento psicológico dos jogadores?
Importantíssimo.

Mas eles aceitam bem?
Hoje há menos resistência, porque existem bons psicólogos do esporte. Eu separo minha vida no futebol em cinco áreas: psicológica, técnica, física, tática e espiritual. Se estou desequilibrado em alguma delas, procuro alguém que me ajude. E a área psicológica é fundamental. Se você entra em campo com um problema em casa, de família, seu rendimento é completamente diferente.

Faltou esse trabalho na seleção brasileira?
Não sei, até porque havia uma psicóloga lá, a Regina Brandão. Se você não convive no dia a dia, é muito difícil falar o que faltou e o que não faltou.

Como você convive com a irracionalidade da torcida?
Existe algo cultural na torcida de cada país. Por exemplo: no Milan, eles têm um grande respeito pelo que o jogador fez na história do clube. Mesmo que eu erre algumas vezes em campo, aplaudem da mesma forma. Então, ex-jogadores que têm uma história e que aparecem no estádio são aplaudidos de pé. Já no Real Madrid há uma pressão e uma cobrança muito grandes por resultado.

Você esperava a total falta de noção e educação da torcida que xingou a presidente Dilma?
Aí entram vários fatores: a política, os problemas pré-Copa, as promessas feitas e não cumpridas, os estádios. Claro que não sou a favor de um xingamento público, como o que foi feito. O grande momento para criticar ou elogiar um presidente é na hora da eleição.

Você foi eleito melhor jogador do mundo em 2007, pela Fifa, e já ganhou muito dinheiro. Qual o seu desafio?
Luto todo dia contra mim mesmo. Esse é o meu desafio agora. Até porque ganhei tudo que podia ganhar na vida como jogador – no coletivo e no individual. É muito bom, mas pode se tornar algo negativo, pois a tendência é a acomodação.

Quer jogar melhor do que você mesmo?
Exatamente. Para isso, chego uma hora antes do treino normal e faço um trabalho físico específico, para ganhar força, agilidade, manter a resistência. Esse trabalho me dá muitos resultados, me ajuda muito em campo, mas também é uma luta pois eu não precisava fazer isto.

Você se impõe uma meta?
Sempre. Por exemplo, vim para o São Paulo e quero dar certo nesses seis meses. Quero ser campeão brasileiro.

Há a possibilidade de você ficar mais do que esses seis meses? Ou seja, “atrasar” um pouco sua ida para o Orlando City?
O acordo com o São Paulo é de seis meses. Depois, não sei.

Por que o Orlando City?
O time foi comprado por um brasileiro, Flávio da Silva, que era dono da Wise Up aqui no Brasil. Ele vendeu a empresa, fez um estudo sobre o futebol nos EUA e decidiu investir lá. A ideia é que eu seja um embaixador da Liga Americana. Vou jogar em um time em seu primeiro ano na liga. 

Como filho de engenheiro, você deve ter um planejamento. Quanto tempo ainda pretende jogar e o que quer fazer depois, quando abandonar os gramados?
Passo seis meses no São Paulo e mais três anos no Orlando. Ou seja, no fim, estarei com 36 anos. Aí depende da minha condição física, de como vou aguentar a temporada, se vou ter lesões. Já no pós-carreira, gostaria de ficar no futebol.

Pensa em ser comentarista?
Não. Mas a gente muda muito, né? Hoje, não gostaria de ser treinador, não gostaria de ser comentarista. Queria ser diretor técnico, alguém que ficasse entre a parte administrativa e a parte de campo.

E criar escolas de futebol? Acha que o esporte é incentivado adequadamente no Brasil?
É muito incentivado, mas nossa formação ainda deixa muito a desejar. Claro que existem escolas muito boas, como a do São Paulo, que forma excelentes jogadores. Minha preocupação na formação não é tanto com relação ao atleta, mas à pessoa. Porque só 10% dos meninos da base vão se tornar jogadores. E o que se faz com os outros 90%? Muitos param de estudar para viver o sonho de jogar futebol, acabam perdendo a infância e a adolescência, mas terão de servir à sociedade de alguma maneira. Como farão isso se não se formaram?

Lá fora é diferente?
Não, é parecido. Mas a formação dos meninos é diferente, eles não vêm de uma classe tão baixa, como no Brasil. A grande maioria é de classe média. Por isso que, aqui, o futebol é visto como esperança por muitos.

Como está, hoje, sua relação com a religião?
Muito ligada a Jesus só. Sou um cara que ama a Bíblia, tenho Jesus como meu exemplo. Então, faço as minhas orações. Tenho a Bíblia no meu telefone e estou lendo muito os Evangelhos ultimamente, para entender um pouco mais de Jesus e das coisas que ele fazia, como fazia e por que fazia.

Ficou decepcionado com os evangélicos?
Não, fiquei muito tempo na Renascer, frequentei a igreja, mas chegou um momento em que achei que era hora de me desligar da instituição. A gente tem uma ótima relação com eles.

Tem algum hobby?
Vou ao cinema, ao teatro, mas gosto mesmo é de ler. Um pouco menos de ficção, um pouco mais sobre personagens, biografias.

É um bom prato?
Gosto muito de comer, mas, até por causa do futebol, aprendi um pouco mais sobre educação alimentar. Passo o dia inteiro comendo frutas e verduras. E sempre que tenho alguma dúvida recorro à nutricionista do clube, a Cristina, e à minha prima, a Lorena, que também é nutricionista. Por causa dessas modinhas de dieta, sabe? Com glúten, sem glúten, com sal, sem sal, lactose, faz bem, faz mal?

Bebe?
Não. Não gosto. Até falei com as nutricionistas para saber se alguma delas via benefício na bebida. Eu não gosto, mas, se me dissessem que tomar uma cerveja faz bem, por exemplo, até tomaria. O engraçado é que morei em dois países onde o vinho é parte da cultura. Com a Carol, até fiz um curso, que foi muito legal.

Sem beber?
Mas eu bebia. Se abrir uma garrafa, eu tomo, mas não é algo que faça por prazer. No curso, a professora perguntava: “Por que vocês estão aqui?”. A maioria respondia: “Ah, eu gosto de vinho” ou “eu tenho uma adega”. Já eu falei: “Queria descobrir por que não gosto de vinho”. Todo mundo começou a rir

Fonte: Gospel + e Estadão

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