SEXUALIDADE sob olhar bíblico

Por mais improvável que a combinação Deus e sexo possa parecer, ela é mais comum do que se imagina. Principalmente para quem busca ligações entre esses assuntos e a “Bíblia Sagrada”. Foi isso que fez Michael Coogan, professor de teologia e diretor de publicações do Museu Semita da Universidade Harvard, escrever o livro “God and Sex” (Editora Twelve, 2010, sem tradução para o português). Nele, o autor cita passagens bíblicas ligadas ao tema e mostra o quão variadas podem ser as conclusões tiradas a partir delas. “Muita gente ainda lê a “Bíblia” como se ela tivesse sido mandada dos céus à Terra por Deus”, diz ele. “Mas ela foi escrita por humanos de uma época e região específicas e precisa ser lida nesse contexto.” Confira o que ele tem a dizer sobre assuntos polêmicos como aborto e homossexualidade, apoiando-se no estudo de trechos bíblicos em hebraico, aramaico e grego.

Adultério, poligamia e prostituição

O adultério, a poligamia e a prostituição são apresentados pela ótica do patriarcalismo. O adultério, por exemplo, é tratado mais como uma violação proprietária do que moral. A mulher que pertence a um homem não deve ser usada por outro. Aliás, os dez mandamentos apresentam a ideia de não desejar a mulher do próximo como um desdobramento da premissa de que não se deve desejar as posses dos outros – o que inclui escravos, animais e … a mulher. A mesma lógica se aplica à poligamia e à prostituição, ambas condenadas, mas toleradas quando cometidas por homens. As regras sobre prostituição, em especial, são curiosas. Se um homem casado se relaciona sexualmente com uma mulher sem marido, não se configura adultério, o mais grave desses três pecados. O mesmo não vale para mulheres.
 
Aborto
 
A “Bíblia” não diz nada especificamente sobre o aborto. Por isso, tanto os que apoiam quanto os que condenam a prática usam as mesmas passagens para defender posições opostas. Como esta: “Numa briga entre homens, se um deles ferir uma mulher grávida e for causa de aborto sem maior dano, o culpado será obrigado a indenizar aquilo que o marido dela exigir, e pagará o que os juízes decidirem. Contudo, se houver dano grave, então pagará vida por vida”. (Êxodo 21:22). Os que defendem o aborto argumentam que, nesse trecho, o status do feto não se iguala ao de um adulto. Portanto, a lógica da “vida por vida” não se aplica ao aborto, que deve ser punido apenas com uma multa. Já os que condenam a prática invocam esta e outras passagens de forma mais genérica. Neste trecho, por exemplo, estaria presente a ideia de que Deus valoriza a vida acima de tudo.

Homossexualidade

Há passagens na “Bíblia” que condenam explicitamente a homossexualidade. No Antigo Testamento, dois trechos em Levítico afirmam que um homem que se deita com outro homem como se deita com uma mulher comete uma abominação e será julgado como “réu de morte”. Mas quem defende a existência de respaldo bíblico para a homossexualidade tem seus argumentos. Um dos mais invocados é o da suposta relação amorosa entre Jônatas e David. É uma tese fraca. David se sentia atraído por mulheres, como conta a história de Betsabá. Portanto, ele seria, no máximo, bissexual.

Sexo

Jesus fala pouco de sexo. O foco dele são mais as relações sociais e os vínculos que os fiéis têm com Deus. Já no Antigo Testamento o tema surge com frequência, mas quase sempre disfarçado. Os redatores foram criativos na hora de descrever a anatomia humana. Os órgãos sexuais, por exemplo, costumam ser chamados de “pés” ou “mãos”, tanto para homens quanto para mulheres. Mas isso não vale sempre. Há, porém, uma passagem explícita sobre sexo na “Bíblia”. Trata-se do Cântico de Salomão. Nele, uma mulher e um homem – não se sabe se são casados – externam o amor que sentem detalhando os atributos físicos do objeto de suas paixões. Seios e lábios, quadris e fendas, odores e curvas são descritos com entusiasmo. Algumas denominações religiosas chegam a extirpar essa parte da “Bíblia” por a considerarem imprópria.

Celibato

O celibato aparece com mais força no Novo Testamento, embora quase todos os apóstolos e os primeiros seguidores de Jesus fossem casados. Inicialmente, o celibato era uma prática valorizada, mas não obrigatória. A lógica que alimentava a simpatia pelo conceito é simples: quem não se casa pode se dedicar inteiramente a Deus. Isso alimentou, em parte, a visão negativa que a Igreja desenvolveu sobre a sexualidade. Ainda assim, até o século XI, não havia regra que proibisse membros da hierarquia católica de terem uma vida sexual. Só a partir do século XII é que o celibato passou a ser obrigatório dentro da Igreja. Na “Bíblia”, porém, não existe essa exigência.
 
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